Entrevista
PAGE Vindes vós o rio agitar,
Com o batel que fretastes?
Tão pouco vós já findastes…
EU Venho pera vos entrevistar.
PAGE Minha boca já deu que falar,
EU Que barca fostes escolher?
PAGE Oxalá tivesse tal prazer…
Oxalá soubesse nadar…
Ai! Ai! Pobre de mi.
E de quem cá sobeja.
Mas mal que passa pela igreja
Só merece ficar assi.
EU Ficar sentado aqui?
PAGE Que quereis que eu faça?
Gracejar de cousa sem graça?
Satanás?... Livra-te d’i!...
EU Porque sentado aqui esperais?
PAGE Tirano era meu amo, sua senhoria
Lhe herdei teimosa fantesia.
Estou negado de algum cais.
Vejo no Inferno temporais
E no céu os meus aposentos.
E vejo correr os tempos…
Que mal me escuta… hu-hu!
Me livra de
Belzebu.
E me prometeu este castigo!
Que do Inferno é meu abrigo!
EU Pera vós, casa de dom Anrique?
Tirando a de Moçambique.
PAGE Esse é meu inimigo…
Pecador como Caifás,
Demónio num barco de madeira,
Que nom deixa entrar uma
cadeira.
EU Cuidas que
com ele remarás?
PAGE Se
entrardes em tal barca, morrerás
E a quem
odiais, rezarás louvores.
Cuidais-me numa vida de
dores?
Vade retro Satanás!…
EU E quando é
que se avia
E se livra deste cais?
PAGE Per Deos,
por quem me tomais?
EU Por Vossa
Senhoria
Humilde
membro da burguesia
PAGE Pois i vos
enganais.
Nobres eram
meus pais.
Príncipes da tirania.
EU Sois vós,
então, da Nobreza?
PAGE Como irmão
fui mal-amado,
E de minha
família fui rejeitado…
E fiquei nesta pobreza.
Nem conquistei nenhuma
duquesa.
EU Peço vos
muito obrigado.
Este
momento será recordado.
PAGE Disso tenho
a certeza…
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